sábado, 23 de março de 2019

Clarice Lispector

Acrescentando mais um autor para meu próximo livro sobre literatura,falo um pouco hoje sobre esta minha desconhecida que é Clarice Lispector.
Eu só tive um contato rápido com ela no segundo grau,lendo “ O Lustre”,mas o que me chamou a atenção para ela foi ver o filme de Suzana Amaral baseado em “ A Hora da Estrela”.
O personagem Macabéa é um dos maiores da literatura universal e expressa como ninguém o abismo que existe entre uma pessoa e outra.Entre o si e o si-mesmo.
Macabéa e uma pessoa muito pobre,mas muito pobre mesmo,que se muda para uma pensão,após a morte de um familiar.
Tem poucas coisas,poucos bens e um emprego chinfrim,ou melhor,um sub-emprego,o qual executa sem nenhuma competência.
No entanto encontra um namorado.E aí o aspecto mais interessante de sua personalidade aparece,que é o desejo permanente de perguntar a ele sobre as coisas que ouve de noite na antiga rádio relógio.
O que é cultura?Você sabia que a unha do pé cresce em milimetros?Ela despeja a sua curiosidade intelectual sobre o nordestino desamparado como ela,que,lógico,não sabe responder.
Há uma outra relação de Macabéa com a colega de trabalho,um loura de farmácia(segundo ,acertadamente,a avaliação de Macabéa),beleza de periferia,a ressaltar a feiúra da protagonista,atributo reconhecido por ela mesmo.
Mas o que avulta em importância é a sua vocação intelectual demonstrada pelo “ vício” de perguntar,que viceja nos estratos mais humildes do Brasil e que poderia ser aproveitado nacionalmente pelos órgãos educacionais responsáveis pelo progresso social do Brasil.
E em segundo lugar,eu,como professor,ao tomar conhecimento da personagem e sendo um otimista ,amadureci,reconhecendo o quão dificil é ,no âmbito de uma subjetividade,fazer este passo de auto-consciência,da vocação para a sua realização.
Macabéa e Clarice me ensinaram algo que eu vinha aprendendo com os estudos que faço da revolução russa,que expulsou Clarice nos anos vinte da Ucrânia,região esmagada pelso comunistas:não adianta forçar o progresso,porque não é legítimo e porquê uma mudança,por pequena que pareça,pode causar transtornos existenciais irreversíveis.Foi assim na revolução.
Macabéa é complexa,cheia de potencialidades,mas presa a uma existência simples,da qual não se sabe se pode e se deve sair.
Cada profissão tem o seu lado ruim e a do professor é muitas vezes querer desenvolver estas potencialidades à revelia do aprendente.Diante de um gênio que só quer se casar, muito professor realiza ultrapassamentos perigosos,no afã de adquirir através do outro ,um nome,que ele mesmo não é capaz de construir.É análogo a certos pais que forçam os filhos a serem gênios precocemente:para cada dois ou três bem sucedidos,um monte enlouquece.
O que me fascina em certos escritores,como Machado de Assis e Clarice é que são capazes de escrever tratados a partir do nada.
Machado construiu personagens comuns,sem nenhum brilho heróico e situações elucidativas sem nenhuma importância,como em “ Memórias Póstumas” e “ Dom Casmurro”(e em outros também).Com isto,com esta capacidade ,ele transformou a inocuidade da classe dominante no Brasil do século XIX e algo de se analisar.Através de um filho família das classes altas do Brasil,Machado o retrata como é e como não deveria ser.
Macabéa no século XX,apresenta como o povo brasileiro é e não deveria ser e expõe a faixa de consciência em que uma mudança poderia ocorrer.
Todo educador,professor ou não,deveria estudar este personagem.

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