De
modo que apesar das mudanças me sinto no direito de me solidarizar
com as pessoas,nos seus momentos de sofrimento,que,hoje,são muitos e
mais.É um tiro no escuro saber se haverá retorno desta
solidariedade(vivemos numa época egoista e competitiva),mas eu ajo e
penso que toda pessoa de bem deve agir assim,por convicção,pela
vontade incondicionada de Kant.O senso de dever e de convicção.
Nietzsche
dizia que tal postura de compaixão é falsa,traduzindo mais o desejo
de aparecer, mais do que se solidarizar,porque ninguém vive o
sofrimento do outro.Mas eu acredito que a compaixão gera a luta para
ajudar a terminar as imensas injustiças que a humanidade perpetra
diuturnamente,principalmente contra quem é mais fraco,contra quem
não tem dinheiro,contra quem não tem nada.
Mas
,não quero nem saber ,eu vou denunciar e protestar aqui ,gostem ou
não.
A
minha formação de socialista e de comunista se fez de diversas
maneiras:leituras e consumo de cultura ,que expressava estes
valores.Neste aspecto avulta em importância a visão de Chaplin nos
seus filmes e especialmente para mim “Luzes da Cidade”.
A
imagem de uma florista cega que corre o risco de ser despejada por
não pagar o aluguel culpabiliza a burguesia, e como um todo o
sistema capitalista em geral:
Ela
encontra o amor de sua vida,pensando ser ele um homem rico.Mas na
verdade é Carlitos:
Em
determinado momento sublime(entre tantos neste filme genial)ela olha
para o céu(onde Deus está?),põe a mão no coração e constrói a
sua esperança(utopia)amorosa e ...financeira,porque esta história
,como o discurso da esquerda, une,num discurso monista,o problema
pessoal(entre os quais o amoroso)com a história,a exploração, a
economia,a totalidade.Não que seja esta a intenção de Chaplin,mas
ele reflete(como em outros filmes “Tempos Modernos”)este referido
discurso da esquerda,a qual ele pertencia e cuja visão acompanhou
desde pequeno,de Londres até à Suiça.
A
conexão direta entre este sofrimento individual e a burguesia fica
assim “provada”,mas na verdade não é bem assim.Desfazendo este
discurso monista ,uma coisa são as relações
inter-individuais,pessoais e outra o sistema social todo.Está
certo,o sistema influencia a vida privada,mas esta guarda autonomia.
E
Chaplin ,com mais genialidade e sensibilidade ,vai neste sentido que
eu estou construindo:na cena final famosa em que a moça,recuperada
da cegueira,por causa dos esforços de Carlitos(e não por causa de
um homem rico como ela pensava e queria),o reconhece ao recolocar a
mão no seu ombro,para adaptar uma flor na lapela do mendigo,ela cai
em si e diz que “agora pode ver”,pode ver a vida como ela é.
Nesta
narrativa genial,Chaplin não concilia com a burguesia,mas a critica
no personagem do milionário,que estando sóbrio não reconhece as
pessoas humildes e que quando bebe o faz,numa bipolaridade
induzida.Ora,por mais vítima que a florista seja ela quer ser
guindada a esta burguesia e ter uma vida de riqueza,mas aprende que
este ideal não é absoluto,não é absolutamente justo.
Aí
que está o que eu quero dizer:não se trata de vitimizar o pobre,o
explorado:o discurso libertário,emancipatório,não é
vitimilógico,mas compreensivo e fundante de uma prática consciente.
O
radical de esquerda,que vai ler este artigo, me chamará de lacaio
da burguesia,de conciliador de classes,estas bobagens,mas não é
isto não.Historicamente ficou claro que suprimir pela força e pela
violência a classe burguesa não significa a implantação imediata
e redentora da utopia.A vitória da utopia se dá no cotidiano do
capitalismo,na construção de uma base subjetiva e
objetiva(econômica)que num determinado momento vai tornar a
superação da classe exploradora inevitável,não no sentido do
socialismo evolucionário de Bernstein,mas no de que será possível
à maioria tomar a decisão de superação,diluindo a minoria,não a
matando.
Em
muitas ocasiões a burguesia não precisou destruir a
aristocracia,mas a modificou por dentro:foi assim nas revoluções
inglesas,na Itália do Risorgimento e mesmo na França do século
XIX.
O
ódio de classe que o titio Stalin aconselhava não serve de
nada.Apenas aplaca a necessidade compensatória dos ressentidos de
qualquer idade.O ódio ao outro valoriza a si mesmo,a pessoa que não
tem nada,senão este ódio.