Há
muito vinha intentando escrever este artigo sobre um pensador do
século XIX,Ernst Haeckel,que,para mim,sintetiza em seu percurso
todos os problemas atinentes ao cientificismo,à ideologia
cientificista,cujo periodo de gestação e maior desenvolvimento foi
o século XIX.E escolhi esta figura até para não escrever um texto
meramente destrutivo,porque ele tem contribuições interessantes
,válidas,embora discutíveis.Isto demonstra a minha visão de que o
conhecimento é construído no tateio,com os recursos que cada época
oferece aos pesquisadores.Dependendo da situação nem tudo está
errado no discurso explicativo ou alguma coisa se aproveita.
Eu
ainda pretendo escrever mais sobre Haeckel e ideologia científica,mas
neste texto trato do monismo.
Monismo
filosófico e científico é uma das variações subsequentes do
materialismo.Por ele entende-se que existe uma causa básica
,fundamental ,em tudo o que existe(o Ser),na physis.
Esta
idéia,o monismo,é nova,mas ,na verdade,se escuda em uma tradição
antiquíssima que remonta ao estoicismo,fundador do
jusnaturalismo,pelo qual a natureza possui “ regras”
imutáveis,trans-históricas,que serviriam de modelo para a
cidade,para a sociedade.
Muito
embora tenha havido,desde então,uma evolução na ciência,este
esquema básico permaneceu.A recusa do jusnaturalismo se deu ou
começou a se dar no século XVIII,com Kant mesmo.Os
parlamentos,recém nascidos,como fautores da legislação e diante de
uma realidade social muito mais complexa,notaram a não exigibilidade
eventual do jusnaturalismo e que o homem podia constituir os seus
próprios modelos.
Mas
a ciência manteve o princípio subjacente de uma única causação.Ora
pelo principio da dialética,em Hegel-Marx,ora pelo da “ unicidade
da natureza” na física newtoniana e ora pela teoria da
evolução,onde se localiza Haeckel.Esta sobrevivência do passado
persiste.
O
monismo cientificista que se forma em torno da evolução(termo já
discutivel)desconhecendo este passado,deplora a filosofia,tida como
especulativa,sem contato com a realidade,num procedimento típico do
positivismo,ao qual Haeckel também se filia.
Fuçando
aqui a minha biblioteca encontrei o texto que procurava ,há
anos,para escrever este texto.Em “ A Origem do Homem”,fazendo uma
crítica aos que pretendiam um retorno a Kant para salvar,apesar da
evolução so dogmas da teologia ele diz que o “ que falat a Kant é
o conhecimento do organismo humano,de sua anatomia e de sua
fisiologia”.No passo seguinte ele inocenta Kant de ter estas “
falhas”,pelo fato de que na época do filósofo não existirem
estas ciências senão em forma rudimentar.
Este
trecho denota que para Haeckel,como a maioria em seu tempo,a
filosofia e a ciência são vistas como uma coisa só,indefiníveis
em sua essência particular,nebulosas.
Este
tipo de confusão ficou até aos albores do século XX.As fraturas da
ciência,expostas pela descoberta do átomo e formação da
psicanálise,destruíram o princípio da causação única.A favor
de Haeckel está a constatação de que a filosofia ,desde os gregos
,sempre misturou o princípio do discurso com a idéia de
causa(Aristóteles).
Lênin
em seu “ Materialismo e Empirocriticismo” embaralha estes
planos,mas a filosofia e a ciência são coisas distintas e é culpa
do monismo ignorar tal coisa,o que gerou intervenções de cada um
destes saberes sobre o outro ,prejudicando a marcha do conhecimento.