quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Compaixão III



Série:Filosofia.

Kant e Nietszche  de  novo:
Por mais que Nietzsche queira  se distanciar de  toda a metafísica,de todo o modelo metafísico que se impõe,a  leitura que ele faz de Kant é  de modo a ressaltar o seu projeto(de Kant)de recuperar a Metafísica.Nietzsche o acusa  de estéril,como toda a metafísica,mas a  liberação do Sujeito e  da linguagem do objeto,como decorrência do pensamento de  Kant é essencial para a atividade ,inclusive na linguagem,extremamente radical de Nietszche.Este último jamais poderia construir um tipo de linguagem não explicativa,muito característica dos seus livros,a  famosa “ prosa  dançarina”,se não fosse  a  revolução copernicana em filosofia  operada por Kant.
No livro do “ Filósofo” ,de Nietszche ,ele faz  reflexões  sobre  o porquê  desta atitude quanto à  sua linguagem mais narrativa do que  explicativa,mais afeita ao mito do que à  ciência,mostrando aquilo que é lógico em todo o seu intento filosófico.
O modo  de  explanação de  Nietsche tem a ver com a narrativa picaresca,a  novela espanhola do século XVI,com Dom Quixote,mas eu diria  que o relato de aventuras,de biografias antigas,que vem desde a Idade Média até ao nascimento do romance moderno,serve de base à  linguagem de Nietzsche.
Aqueles que lêem ,por exemplo,os  “ Fioretti” de São Francisco de Assis(as “ Florezinhas”),vê  no inicio dos  capítulos:”De como São Francisco foi à  floresta e recebeu os estigmas de Deus” ou”De como ficou nu diante  da Igreja de Assis”.
Para Nietzsche esta é a base de uma narrativa que ,antes de explicar algo ou uma pessoa,segue-lhe os passos próprios,originais,sem referência a outra coisa  que a ela mesmo.Não poderia  ser diferente.A perspectiva determina a  linguagem narrativa, não o debruçar-se  sobre o objeto.
Valorizar as narrativas significa por abaixo toda objetalização,toda modelação de  fora para dentro ,que toda a metafísica(e  a ciência  ,que é o seu deus)opera.
Esta  é uma tendência do final do século XIX,dir-se-ia(contra Nietzsche)humanizadora,das ciências sociais e  que encontrou no século XX,na  antropologia em geral,eco,na medida em que,em vez  da explicação científica,temos a narrativa de costumes  e ações,como forma  de não só mostrar uma realidade social,as causas dos seus problemas,mas o seu sentido,ou possibilidade de sentido.
Esta narrativa expressa aquele que tem o sentido real da  vida,gratuita,sem uma preocupação com o sofrimento.Nós voltamos aqui ao tema do nosso artigo:o sofrimento de  cristo e  a indiferença do ser humano gera uma culpa,a  qual  deve ser  a base do compassivo,que  deve sofrer para purgar esta  culpa e ganhar a redenção numa salvação sempiterna.Em vez  de um caráter nobre que coma  sua narrativa vive a vida,temos  alguém que só vive  no meio d e outros,porque associado á compaixão geral como exigência  moral de  conduta.
Não vou tratar aqui do ideal ascético,mas a  questão toda é que a  compaixão gera,cimenta o ressentimento,como projeto de vida.Criou-se  a partir do cristianismo(que tem uma origem em Platão)uma ética do fraco,que é aquele que não consegue  viver sem esta justificação(o sofrimento)e  sem atribuir  ao caráter  nobre a  culpa deste esquecimento.
Este nobre   recusa  o conselho de  São Paulo aos coríntios em que este os acusa de viverem a vida sem se lembrar do sofrimento de Cristo na cruz.É o famoso “ comamos e bebamos que amanhã morreremos”.
Contudo sempre  me foi impossível de  aceitar as relações  entre Nietzsche  e Marx neste aspecto.
Niestzche  e Marx
Na  década de sessenta  do século XX surgiu,no mundo todo  uma relação que eu considero esdrúxula entre este pensamento e  Marx.Este último nunca abandonou as suas afirmações  sobre o  caráter compensatório da religião que  expôs na Filosofia do Direito.O que ele mudou(talvez)tenha sido uma  visão mais leniente que ele tinha quando jovem.Na maturidade colocou claramente ,como condição da libertação(coletiva) da humanidade,a  supressão da  religião,mas não há prova de  que tenha  defendido matanças ou agressão,antes pelo contrário,afirmando o papel decisivo da educação.
E mais do que isto,se o ideal de liberdade não é individual,não há porque no processo de consciência(coletiva) desta necessidade não se  incluir (na abnegação revolucionária  pelo outro)um elemento de compaixão ou  reconhecimento do sofrimento como legitimador da revolta.
O que não se  pode extrair  de Marx é  o sofrimento como finalidade.E também não há como associar a figura do revolucionário a este nobre acima dos outros,de Nietzsche.
De tudo o que eu disse fica claro que  a  autenticidade da vida não se pode  fundar no caráter “nobre” daquele que vive sem pensar no sofrimento.E é legítimo abrir mão de paixões  alegres em nome desta compaixão ,que funda todo o solidarismo.Logo ,com culpa ou sem culpa,diante da cruz , a existência autêntica  se mobiliza também.Não há como não se  associar Nietszche  aos descalabros terríveis que aconteceram no seu país tempos depois.
Porque por mais acima deste sofrimento mundano,o caráter nobre é tocado pela  experiência do passado e do presente e  quando a nega comete crimes.



Nenhum comentário:

Postar um comentário