domingo, 19 de abril de 2020

O Deus Ateu

De uma ideia de Slavoi Zizek

Observando um documentário de Slavoi Zizek sobre ideologia e cinema,lá pelas tantas ele se refere a Cristo como “ o Deus mais ateístico que já existiu”.
Esta afirmação aparentemente escandalosa faz sentido na medida em que a figura de um Deus que sofre como um ser humano comum,era necessária diante de um Deus absconso que não participava dos sofrimentos terrenos e não oferecia soluções para estes males.
Para uma nova aliança um deus-humano,um deus-igual,um deus-comum apresentava mais condições de,ao menos,mostrar uma luz no fim do túnel,uma vez que seu sacrificio impunha um engajamento real nos problemas humanos,já agora misturados com os de Deus(se é que Deus tem problemas[seu filho tem]).
O cristianismo,que repudia o politeísmo como idolatrico e próprio de pagãos,cai nele a partir do nascimento do cordeiro,pois não é mais um Deus ,mas dois,ou ,respeitando o catecismo,três,pai-filho-espirito santo.Isto sem falar na pletora de santos,alguns puro sincretismo com mitos gregos(são cosme e são damião/castor e pólux).
Esta queda no mundo,onde está a corrupção dos tempos,era uma exigência destes mesmos tempos para recuperar a confiança em Deus e dar-lhe uma presença(Heidegger)maior.Este é o nucleo essencial do messianismo:a salvação(real).
Contudo esta nova aliança ,através de um salvador real,implica num risco sério de prescindir de algo(Heidegger)mais que o soterós(salvador):Deus,o Deus-pai.Dentro do espirito do monoteísmo,o certo seria,como Kierkegaard colocou,Ou Cristo,Ou Deus.
Cristo,o Deus que se apresenta(Heidegger),é suficiente,até porque nasceu por decisão de Deus-pai,que já não era mais capaz de propor outra aliança,a partir de si.E um Deus assim,não o é de uma religião,mas ,no máximo,se sustém como simbolo ou valor ou os dois de quem não necessariamente acredita em Deus.Mesmo para quem acredita, a sua natureza humana é suficiente.
Tudo o mais é interpretação,a servir ou não a quaisquer propósitos,legítimos e ilegitmos.Quando trato de Cristo aqui já analiso estas interpretações,mas entendo que há um traço divisivo nestas interpretações:o crente e o não crente,aquele que se liga à divindade e o que não.
Normalmente(salvo seitas que eu não conheço)o crente segue o princípio de que Cristo é mais afeito ao além-mundo(e daqui outras interpretações)e o não crente,que Cristo está no mundo,embora não seja identificado com ele(não é um Deus panteísta).
Neste último aspecto me incluo.Vejo Cristo da perspectiva de um agnóstico,que o entende como um simbolo(aceitá(do[vel]{ou não}).Um simbolo representativo de muitas coisas,mas fundamentalmente de unidade(proposta)da humanidade.
Os crentes compreendem esta unidade em termos de uma idealização ,baseada na divindade de Cristo-Deus,cujo messianismo promete o prêmio da ressurreição(oposto ao pecado[morte]),pelo sofrimento(na cruz).É idealização porque não há provas destas passagens.
Os não-crentes estão naquele ponto de São Paulo,falando aos corintios,aconselhando-os a não esquecer da cruz.São Paulo une o mundo à divindade,como sabemos,mas os agnósticos ficam com o mundo e com esta lembrança(memória,no caso do sofrimento de Cristo[que está no passado]) do sofrimento,que se repete na vida humana,sempre,e contra o qual o agnóstico e o ateu de bem deve lutar.Explicarei porque no próximo artigo.

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