Nos idos dos anos oitenta ,quando o Flamengo vivia a sua fase
de ouro,num sábado tranqüilo ,de calor e de espera de uma decisão de
campeonato,no domingo,uma reportagem na casa do ídolo Zico me chamou a atenção
,que me causou uma impressão até hoje presa em minha memória.
Num dado momento foram entrevistar o pai de Zico,o velho
Antunes,sobre a fase extraordinária de Zico,no Flamengo e na vida,coroando a
sua carreira pessoal de jogador.Ao responder a esta pergunta o velho Antunes
disse que,naturalmente,ficava feliz por seu filho,mas que achava que entre os
seus filhos o que melhor jogava era o primogênito ,de mesmo nome,Antunes,que
,segundo ele,” ensinara todos a jogar”.Todos ele se referia ao próprio Antunes
e a Edu,que são irmãos jogadores de
Zico.
Quando contaram a Zico,no dia,esta resposta,ele disse ,em forma
de blague,que o pai não entendia de futebol e eu,diante da televisão,não
entendi esta “ pixotada” futebolística e no dia seguinte até pensei em uma
certa arrogância,porque dizer que Antunes era melhor que Zico representava
aumentar de mais a ambos os irmãos e a família.
Mas a vida foi mostrando que a situação era outra.O velho
Antunes o fez com o intuito de não deixar os seus outros filhos na sombra de um
deles,que tinha sucesso.Quando Edu,na década de sessenta,era o mais bem
sucedido,ele valorizava Zico e assim por diante.
O velho Antunes demonstrou uma sabedoria prática,que muita
gente com PHD não tem,provando que a vida é um livro,no qual se lê e se aprende.E levando em conta que o
discernimento é o conhecimento verdadeiro,não a quantidade de conhecimento,o
saber do Sr. Antunes é tão legitimo ou válido quanto o produzido nas
universidades.
Eu uso este exemplo para comparar com o primeiro artigo do
tema referente a Freud ,no qual eu tratei da desigualdade e narrei um episódio
conhecido da vida do criador da psicanálise.Rememorando:Freud mostrou,desde
pequeno,superdotação intelectual e acumulou em casa ,muitos livros.Numa pequena
escrivaninha começou a escrever e incomodado com o piano das irmãs brigou e pediu
ajuda ao pai,Jacob,para que as impedisse de atrapalhá-lo.As irmãs se sentiram desprestigiadas pela decisão do pai
que mudou os pianos e exigiu que elas considerassem e respeitassem as novas
necessidades do menino precoce de nove anos,como é representado na fotografia
acima.
Em outras famílias haveria uma provável repressão ao
menino,alguma acusação de pretensão,porque o valor médio dominante é igualar
todo mundo na mediação da “ humildade”,que é a condição supostamente universal
da condição de progresso em qualquer área.
De repente se o Sr. Jacob pensasse assim o desenvolvimento de
Freud,que,como em todo intelectual,se inicia nesta idade,sofresse irreparáveis
prejuízos.
Os homens nascem
desiguais,como acertadamente afirmou Locke.Na História é necessário,muitas vezes,controlar o ímpeto
criativo porque ele põe em risco autoridades .Num contexto de miséria,inclusive
espiritual,mas igualmente material,o aparecimento daquele que se destaca gera
ressentimentos nos outros,que não querem ser superados,como as irmãs de Freud.Sobrevêem
formas ideológicas ou mesmo físicas(castigos)de repressão sobre esta figura que
se distingue.
A família é um complicador porque ela existe para educar
pessoas no inicio de sua existência e portanto destituídas ,em principio, de uma vivência e dependentes de uma
autoridade,a qual pode ter vivência ou não,pode ser democrática ou repressiva.
Freud teve uma imensa sorte de ter um pai que entendeu a
verdade dos fatos:há que respeitar ,desde sempre ,a desigualdade natural dos
homens e explicar isto aos filhos de modo que eles não se ressintam.
Isto é muito difícil de evitar se houver efetivamente um
privilegiamento de um filho .Não importa que a criança se adéqüe à
realidade,que tenha consciência de suas diferenças,mesmo porquê é difícil
também explicar isto a um ser sem vivência quando ele entende que a sua
atividade é inferior(no entender dele e da sociedade)a do outro.De um jeito ou
de outro é preciso que os filhos sejam igualados por cima ou por baixo.
Por cima quer dizer:todos eles devem ser instados a acreditar
em suas atividades,como no exemplo do velho Antunes.No caso de Freud,o velho
Jacob parece ter resolvido tudo mantendo Freud no seu canto e as filhas em outro e os
incentivando do mesmo jeito.
Por baixo quer dizer,numa família despojada ,em que não há o
desejo de realizações intelectuais,todos são incentivados igualmente a fazer as
suas escolhas e realizar.
O trabalho intelectual ,como aquele que tem um reconhecimento
social maior, geralmente causa ressentimento nos outros e isto se reflete e se
reproduz na família e não se trata de se aferrar num principio igualitário ou
desigualitário,mas de respeitar as escolhas de cada um dos entes da família,criando
oportunidades,incentivando e evitando esta falsa manipulação social,que
desconsidera uma atividade,em relação a outra qualquer.
Sou fã de Jacob e do velho Antunes,pois eles são grandemente
responsáveis pelo sucesso dos filhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário