terça-feira, 10 de maio de 2016

Meu encontro com Marx e Freud IV


A primeira coisa que se pergunta quando se fala em Freud(e em Marx também)é para quê eles(ainda)servem.Faz algum sentido desenvolver idéias provenientes destes pensadores?Ora,quando se vê que há uma “ resignificação do materialismo histórico” ,a meu ver,bastante válida,o mesmo se pode fazer em relação a Freud,mas no caso dele,não é uma resignificação :uma recolocação em bases mais limitadas.
Freud é um dos tantos pensadores que ,depois de Galileu,intentaram construir novas e definitivas ciências.Em suas alocuções ,inclusive gravadas, Freud se refere ao fato de ter tido ,na vida ,“ este pedacinho de sorte(palavras dele)”que é  ter descoberto a ciência da psicologia.
Assim outros ,ao longo dos séculos,se proclamaram inventores de novas ciências definitivas:o citado Marx,Mendel,Lombroso,Comte e muitos outros.
Grande parte da dissensão havida entre Jung e Freud,que chamou o primeiro até de anti-semita,é por causa da constatação de que isto não era verdade e era um reflexo do positivismo do século XIX.
Em 1910,quando se encontraram(e conversaram direto 13 horas seguidas),Freud estava no auge da liderança do seu movimento psicanalítico.Inteligentemente ,ele procurou se cercar de seguidores que concordando com ele o ajudariam a suportar as criticas que viriam aos montes,nos anos seguintes.Mas ,de forma arrogante e inconsciente(talvez?),queria garantir o status supradito de sua “ descoberta”.
Jung mostrou-lhe que era possível desenvolver novas idéias sobre psicologia,profundamente divergentes do pensamento do mestre,o que abalou Freud profundamente.
Isto,no entanto,era o começo da recolocação epistemológica de Freud.Se Marx era um teórico que elaborou um método(talvez?),social,Freud calcou o seu trabalho e o seu método nas neuroses,na inadequação essencial,que deve ser reconhecida,de toda a subjetividade humana.
Percebe-se ,ao longo de sua obra,aplicações em outras patologias,mas o resultado não é o mesmo.Disso tratarei proximamente.
O que fica claro é que o método psicanalítico modificou profundamente a concepção do homem sobre si  mesmo e neste aspecto ajudou a acabar com a ocorrência comum na época vitoriana,da pior das neuroses, a histeria.Por causa disto há uma tendência a afirmar a superação de Freud,porque não haveria mais neurose a curar e então a psicanálise teria se transformado num teatro egocêntrico,mutuamente complacente entre o paciente e o analista.
A psicanálise serviria apenas para escritores ,artistas e criadores em geral com problemas específicos.
Mas aí eu pergunto:estas atividades não adquiriram um papel terapêutico,principalmente com Jung?E dentro deste papel terapêutico a compreensão da neurose,por aquele que faz arte e por aquele que a aprecia,não ajuda,de certo modo,numa adequação essencial do sujeito neurótico?Isto sem deixar de considerar que a neurose é parte do patrimônio subjetivo do homem em seu processo de crescimento,sendo o reconhecimento da frustração(a negativa da adequação[dialética?])como algo fundamental para este crescimento.
Acaso a inadequação acabou porque Freud a desvelou?Para mim a resposta é não e o seu pensamento ,dentro destes limites e com outros recursos(arte)pode ajudar o sujeito neurótico a se  adequar(crescer).
O problema é que a psicanálise exige do potencial paciente uma  preparação,inclusive cultural,para aproveitar os benefícios da análise.Notem que eu não me referi ao fato de só pessoas de cultura podem fazer a psicanálise,mas aqueles que em determinados níveis de cultura compreendem os seus problemas de inadequação(frustração).
Hoje ninguém identifica a cultura com a civilização e isto se deve em grande parte ao próprio Freud,em seu último livro “ O mal estar na Cultura”,que foi traduzido errado  inicialmente , refletindo preconceitos antigos,como “ mal  estar na civilização”.A sociedade primitiva.não civilizada não teria condições de chegar ao conhecimento.
O homem de cultura pode ser o professor universitário tanto como babalorixá de um candomblé.
Através da cultura há como identificar a neurose  e eventualmente tomar a  decisão de buscar o método para “ curá-la”.
No cotidiano opressivo,marcado pelo objetivo da sobrevivência(e não da vivência),é difícil ,senão impossível,preparar-se para um autodescoberta.

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