A primeira coisa que se pergunta quando se fala em Freud(e em
Marx também)é para quê eles(ainda)servem.Faz algum sentido desenvolver idéias
provenientes destes pensadores?Ora,quando se vê que há uma “ resignificação do
materialismo histórico” ,a meu ver,bastante válida,o mesmo se pode fazer em
relação a Freud,mas no caso dele,não é uma resignificação :uma recolocação em
bases mais limitadas.
Freud é um dos tantos pensadores que ,depois de
Galileu,intentaram construir novas e definitivas ciências.Em suas alocuções
,inclusive gravadas, Freud se refere ao fato de ter tido ,na vida ,“ este pedacinho
de sorte(palavras dele)”que é ter
descoberto a ciência da psicologia.
Assim outros ,ao longo dos séculos,se proclamaram inventores
de novas ciências definitivas:o citado Marx,Mendel,Lombroso,Comte e muitos
outros.
Grande parte da dissensão havida entre Jung e Freud,que
chamou o primeiro até de anti-semita,é por causa da constatação de que isto não
era verdade e era um reflexo do positivismo do século XIX.
Em 1910,quando se encontraram(e conversaram direto 13 horas
seguidas),Freud estava no auge da liderança do seu movimento psicanalítico.Inteligentemente
,ele procurou se cercar de seguidores que concordando com ele o ajudariam a
suportar as criticas que viriam aos montes,nos anos seguintes.Mas ,de forma
arrogante e inconsciente(talvez?),queria garantir o status supradito de sua “
descoberta”.
Jung mostrou-lhe que era possível desenvolver novas idéias
sobre psicologia,profundamente divergentes do pensamento do mestre,o que abalou
Freud profundamente.
Isto,no entanto,era o começo da recolocação epistemológica de
Freud.Se Marx era um teórico que elaborou um método(talvez?),social,Freud
calcou o seu trabalho e o seu método nas neuroses,na inadequação essencial,que
deve ser reconhecida,de toda a subjetividade humana.
Percebe-se ,ao longo de sua obra,aplicações em outras
patologias,mas o resultado não é o mesmo.Disso tratarei proximamente.
O que fica claro é que o método psicanalítico modificou
profundamente a concepção do homem sobre si
mesmo e neste aspecto ajudou a acabar com a ocorrência comum na época vitoriana,da
pior das neuroses, a histeria.Por causa disto há uma tendência a afirmar a
superação de Freud,porque não haveria mais neurose a curar e então a
psicanálise teria se transformado num teatro egocêntrico,mutuamente complacente
entre o paciente e o analista.
A psicanálise serviria apenas para escritores ,artistas e
criadores em geral com problemas específicos.
Mas aí eu pergunto:estas atividades não adquiriram um papel
terapêutico,principalmente com Jung?E dentro deste papel terapêutico a
compreensão da neurose,por aquele que faz arte e por aquele que a aprecia,não
ajuda,de certo modo,numa adequação essencial do sujeito neurótico?Isto sem
deixar de considerar que a neurose é parte do patrimônio subjetivo do homem em
seu processo de crescimento,sendo o reconhecimento da frustração(a negativa da
adequação[dialética?])como algo fundamental para este crescimento.
Acaso a inadequação acabou porque Freud a desvelou?Para mim a
resposta é não e o seu pensamento ,dentro destes limites e com outros
recursos(arte)pode ajudar o sujeito neurótico a se adequar(crescer).
O problema é que a psicanálise exige do potencial paciente
uma preparação,inclusive cultural,para
aproveitar os benefícios da análise.Notem que eu não me referi ao fato de só
pessoas de cultura podem fazer a psicanálise,mas aqueles que em determinados
níveis de cultura compreendem os seus problemas de inadequação(frustração).
Hoje ninguém identifica a cultura com a civilização e isto se
deve em grande parte ao próprio Freud,em seu último livro “ O mal estar na
Cultura”,que foi traduzido errado
inicialmente , refletindo preconceitos antigos,como “ mal estar na civilização”.A sociedade
primitiva.não civilizada não teria condições de chegar ao conhecimento.
O homem de cultura pode ser o professor universitário tanto
como babalorixá de um candomblé.
Através da cultura há como identificar a neurose e eventualmente tomar a decisão de buscar o método para “ curá-la”.
No cotidiano opressivo,marcado pelo objetivo da
sobrevivência(e não da vivência),é difícil ,senão impossível,preparar-se para
um autodescoberta.
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