Serie metalinguagem em filosofia
O que seria de Aristóteles sem os comentaristas
árabes?Ele não teria chegado a São Tomás de Aquino,que o usou para construir
uma autoridade gnosiológica e " paralisar" o conhecimento.Ficar só
nos filósofos obedece a esta lógica tomista de poder e paralisação do
conhecimento.Na história como na vida o passo seguinte é o mais importante,porque
a vida e o tempo não param.É possível ,e isto se vê em alguns momentos da
história ,que fiquem só os comentaristas.Há comentaristas de Descartes como
Beyssade que são indispensáveis,de David Hume e Locke também e hoje não se pode
ler Marx,principalmente o Capital, sem ler ,pelo menos junto,toda a discussão
em torno dele nos últimos cem anos,sem o quê o militante se torna uma criança.
É lógico que a origem,a fonte das discussões se dá
sempre com os filósofos.Eu já defini:filósofo é aquele que tem um
pensamento-fonte de outros.Ele é original como fonte de outros pensadores.
Um pensador,um filósofo,no entanto,não são
dissociados do mundo e de seus antecessores,mesmo estes originais.
Não existe Derrida sem Heidegger e eu,Ernesto
Maggiotto Caxeiro,posso usar como fonte interpretações de Derrida,mas nem este
nem eu somos filósofos no sentido próprio do termo.E a originalidade não é
absoluta.
Também é um problema o grau de universalidade que
um filósofo alcança.Os poucos grandes filósofos são universais.
Contudo,a passagem do tempo vale para eles e a humanidade também,nos seus erros e
incapacidade eventual de serem absolutamente transhistóricos,transtemporais.Ninguém
controla a sua imortalidade de modo nenhum.
A discussão entre filósofos e comentadores é,guardadas
as devidas proporções,a mesma entre professor e aluno e é exemplificada aqui
pela relação famosa entre São Tomás de Aquino e Aristóteles.
Quando se alega a verdade de um
mentor,digamos,busca-se a intocabilidade,o poder,porque em princípio e sempre a
relação é de questionamento,pois sem isso não haveria filosofia,bem como
qualquer saber.Não haveria tempo,passo seguinte.
Por mais genial que seja um autor está sujeito a
erros e é um direito e uma necessidade questioná-lo.
Nas escolas e nas universidades,até mais ou menos o
mestrado,não se admite a discussão,para manter a relação de autoridade
professor/aluno.É uma exigência de disciplina,mas não é verdade que tal
assertiva garanta a veracidade e a importância
do conhecimento,e a sua manipulação ideológica como consciência falsa do
mundo pode estar presente.
Por isso sempre defendi e sempre pratiquei a
necessidade ,em qualquer tempo,da discussão,do questionamento,desde o jardim de
infância,porque só assim evitam-se estes perigos que rondam a produção do
conhecimento.
“Da discussão nasce a luz” já dizia Goethe e o conhecimento
não pode,como quis São Tomás,ser paralisado,porque o tempo não é paralisável e
a realidade social e natural se modifica e parece infinitamente observável.
Esta última lição foi dada ao positivismo de
Comte,outra formulação ideológica,quando ele afirma que só aquilo que podia ser
observado era objeto de ciência.O átomo e sua comprovação puseram por terra
este erro.
Newton errou ao dizer que “ matéria atrai matéria
na razão direta das massas e no inverso do quadrado das distâncias”,porque
Leibniz contestara,dizendo serem o espaço e o tempo
relativos,relacionados.Porque não é “ quadrado da distância,mas da massa ,como
provaram Lorentz e Einstein.
Sobre Marx eu já falei,mas é importante ressaltar
esta passagem do tempo e reconhecer a errância humana(Nietzsche)em todos,não só
os filósofos.
David Hume pode ser fonte de muitos pensadores,em
sua obra toda,mas o decisivo é um único trecho do “ Tratado do Entendimento
Humano”,que influenciou Kant,tirando-o do seu “ sono dogmático”.Neste mesmo
Tratado Hume afirma que Locke não tem mais importância e realmente,Locke só é
reconhecido nos dias atuais pelo segundo
“ Tratado do governo civil” que serviu de base à Independência dos
Estados Unidos e pelo reconhecimento da empiria no pensamento de Kant,que une
Hume a Locke(ironia).
O próprio Kant,na sua “ Crítica da Razão Pura”
propõe uma revitalização impossível da metafísica,mas esta foi superada por ele
mesmo,que atirou no que viu e acertou no que não viu.
Não há tanta distância assim entre o passado e o
futuro,entre o professor e o aluno,entre o filósofo e o comentador.
Nenhum comentário:
Postar um comentário