quarta-feira, 16 de agosto de 2017

A reprofissionalização da Filosofia:Husserl e Heidegger



Sendo como eu sou um critico das filosofias metafísicas e sempiternas,muito em voga no Youtube,que é o lugar em que qualquer um se arroga a condição de “ professor “ e “Filósofo”,este meu trabalho articular é importante para eu colocar alguns pródromos de minha atividade de blogueiro.
Esta forma articular é a que melhor se adapta às minhas condições pessoais de vida,mas também tem a ver com a minha formação intelectual e com os meus objetivos.Nietzsche escrevia pequenos textos e se orgulhava de dizer muito com pouco.Me too.
O meu interesse é o mesmo,mas acima de tudo esta forma articular me permite tratar de assuntos complexos de uma forma mais simples e mais acessível  ao público em geral.
Quando eu era comunista aprendi com Lênin que era  preciso escrever para a classe trabalhadora e, sem falsear ou simplificar os problemas, abordá-los em sua complexidade.Hoje eu reinterpreto esta baliza pensando em fazer um trabalho acessível ao senso-comum,mas sem demagogia ou vulgarizações.Isto quer dizer,os meus textos aqui exigem elevação das pessoas que não estão acostumadas a estes temas,mas com esforço é possível com os elementos do texto.
Contribui para isto a minha experiência de professor em comunidades quase-carentes.Ninguém sabe o quanto é difícil lecionar sexta-feira à noite,filosofia ou ciência política em Bangu.As pessoas estão interessadas no fim-de-semana,preocupadas com a balada próxima e não estão nem aí para estes temas,isto sem contar que lecionei sempre para faculdades de direito,cujos alunos são  psicologicamente pragmáticos e ávidos de dinheiro.
Lembro-me de ter dado verdadeiros cabriolés para poder explicar-lhes o conceito de soberania popular.Tive que fazer uma analogia futebolística,especialmente com a torcida do flamengo:a soberania popular funcionava como a torcida do flamengo que vota nos dirigentes do clube,mutatis mutandi(a eleição é indireta)e os pressiona para ganhar campeonatos e ter vitórias.
Então estes textos articulares são fundamentados metòdicamente e como posso fazê-los rapidamente eles se encaixam bem na minha vida de trabalho.Eles me fazem transcender kantianamente os obstáculos do cotidiano.
Outra questão muito importante é o da inovação contida neles.Eu já disse em outro lugar que não sou filósofo original.Eu não faço como certos filósofos auto-arrogados(ortografia certa) do Youtube que mentem todo dia,os quais mentem nestas questões de fundamento igualmente.Tem um que lê os meus artigos mas não é homem de me citar,de dar os créditos por tê-lo incitado a pensar.Não que,e isto responde ao problema da inovação,eu seja profundamente inovador nestes textos.
Contudo,como eu já expliquei outras vezes,como pesquisador,critico de cultura,investigador,é lógico que muitas das noções que eu apresento aqui são conhecidas,mas não do grande público.Uma das minhas tarefas é informar o grande público destas questões ,da importância delas no cotidiano.
Eu não sou demagógico.Os meus textos exigem um esforço de compreensão,mas isto é possível a partir dele mesmo.
Os meus textos de marxismo visam explicar à esquerda brasileira o quanto ela está ultrapassada e quanto  não conhece da história e dos conceitos do movimento social e comunista,o que a faz cometer erros grosseiros,os quais levam o país ao estado em que se encontra hoje(no Brasil pelo menos).
Dentro destes meus objetivos,que não são inovadores, eu faço o que todo mundo faz:interpretações ,atualizações,aplicações sobre a realidade e assim por diante.
Algumas destas atividades geram ,às vezes,idéias que não são muito comuns de se ver em textos ou na boca de quem quer que seja.
No blog sobre marxismo eu tenho dito que a nação é o campo de batalha da esquerda moderna e eu não tenho visto estes conceitos na esquerda em época nenhuma ,mas posso estar enganado.
Aqui no blog dos conhecimentos em ciências(ou saberes) humanos,acontece a mesma coisa.Busco inovações ,busco trazer novas idéias,mas como todos os brasileiros não tenho condições de propor conscientemente um discurso universal,trans-histórico.Nem penso nisso.Tem filósofo da direita aí,no Youtube,que acha que consegue,mas não consegue,é mentira.
Nós brasileiros não temos acúmulo de conhecimento para produzir algo extremamente novo e universal,que valha para o mundo todo.Poucos brasileiros conseguiram espraiar-se para outros locais.Este é o caso de Euclides da Cunha,que ficou famoso também na América latina,analisando o salvacionismo em “ Os Sertões”.Analisando o Brasil,podemos ser universais.
Husserl e Heidegger
Dito isto eu passo ao tema de agora.Husserl elaborou um pensamento que mudou o século XX,mas ele era baseado no mesmo projeto metafísico estéril de Kant(e de Platão).
Husserl através do conceito de “ redução fenomenológica” ou “ eidética” mostrou o seguinte:racionalmente o Ser é compreendido por sua essência,que é feita na mente humana ,separando aquilo que o define daquilo que não,ou que pertence ao todo,às outras coisas,aos outros seres.
Uma cadeira é definida essencialmente como um objeto para sentar,mas ele possui características,forma,material ,design,cores que não são só dela.Mas o ser concreto ,em si mesmo é tudo isto.Então dizer que a existência da cadeira e do Ser é definida só pelo que é essencial é falso,porque o Ser concreto real é tudo isto.
Pela redução fenomenológica de Husserl o Ser deve ser visto,visado desta forma,mas neste caso a sua nomeação é só através da linguagem,a qual se conecta não com ele,mas com a subjetividade e sua intencionalidade .
Quando alguém olha uma parede teve a intenção de vê-la e defini-la e pode lhe atribuir significados segundo esta intencionalidade,que é uma mediação essencialmente psicológica(ego).Até aqui tudo bem.
Só que neste momento Husserl faz uma inflexão pensamental típica de Kant ele próprio: busca convencer que esta atribuição de significado,que nasce da intencionalidade,da escolha subjetiva,se refere apenas ao Eu,à capacidade ideatória do Sujeito.A idéia é um invariável lógico,intelectual,que não se reporta à substância do Ser e do Sujeito,direta ou indiretamente.A escolha de olhar uma cadeira,como outras escolhas, não se reporta  a uma verdade psicológica que a condicione.
É  óbvio  que quando andamos pelo mundo vemos coisas a que não damos importância nenhuma e olhamos outras que consciente ou inconscientemente nos interessam.Uma escolha intencional momentânea,contra a psicanálise,não tem senão uma natureza pensamental,ideatória,pura.É a chamada visada ,mas a visada, por mais pura que seja ,não denega a sua origem intencional,consciente ou não.É a psicologia do ego que move o corpo para a visada,ainda que não haja relevância maior.O Eu e o Ego são experiências e por isso se tocam obrigatoriamente.Não há ruptura da experiência humana.
Acontece que Husserl entendeu que esta visada é só do EU e chamou este Eu,de EU Transcendental,ou seja, um EU sem referência  è experiência,mas apenas à capacidade ideatória do Sujeito,que seria assim um ente singular,absolutamente singular.
Eu vi na Universidade este conceito ser usado para explicar como certas pessoas,de posse dele,poderiam chegar aos seus objetivos.Uma professora disse uma vez que intuitivamente Chaplin sabia desta verdade e por isto saiu de um cortiço para morar num castelo na Suíça...
Eu digo que Heidegger,apesar das restrições pessoais que tenho com ele(inclusive ter prejudicado Husserl que era seu Mestre,mas  judeu),reprofissionaliza a Filosofia(talvez esta seja uma idéia inovadora)na medida em que põe o Ser na voragem do tempo,que é um conceito que expressa algo real e comum a todos os entes .
Não existe não-tempo no EU.O que as Filosofias sempiternas,atéias ou religiosas, não entendem é que a  idéia é inserida na temporalidade.O Sujeito não é definido por momentos de visada,não inter-relacionados,isto é impossível.Só os loucos e olhe lá vivem nestes momentos desconexos.O homem consciente faz escolhas que constituem o seu sentido na vida e são a sua vida.Eventualmente vemos as coisas sem um propósito,mas obrigatoriamente fazemos coisas com intenções  e isto dá sentido e direção ao cotidiano,por mais banal que seja.
Não há transcendental possível.Isto é uma invenção de Platão,que ganhou foros de religiosidade em São Tomás e permanece ,às vezes,nos filósofos modernos,ávidos de algo novo,que não é de fato.
Nós presenciamos hoje uma volta a estas especulações solipsistas do Bispo Berkeley,para tentar novamente provar a existência de Deus e a sua atuação no mundo e em nós.Embora Kant tenha se dissociado com um certo rancor deste filósofo,na “ Estética Transcendental” contida na “ Crítica da Razão Pura” tem que reconhecer a realidade do mundo sensível,ainda que depois,para fazer coisa idêntica ao que Platão propôs:menosprezar os sentidos e só valorizar a intelecção.os dois filósofos querem que o intelecto dirija a sensibilidade,mas Kant tem que reconhecer o seu papel importante,mais que Platão.
Contudo o projeto kantiano ,como nós professores ensinamos na universidade,só surge para responder ao problema proposto no século XVIII:se qualquer homem(simples razão[e não só os reis e príncipes])pode fazer filosofia(original).Como ignorar a sensibilidade ,em seus múltiplos aspectos se a resposta de Kant é considerada positiva?Kant não se referia à sensibilidade,mas à prática.Acaso isto também não iguala a todos?Acaso na prática isto não é aceitar a sensibilidade?E dentro dela,o tempo?E dentro do tempo,o Ego?O Ser Humano não está no tempo?
Quando Heidegger fala no sentido ele está se referindo o movimento constante do ser e do Sujeito em todos os momentos.
Acordo de manhã e me preparo para ir trabalhar.Pago um ônibus,trabalho,almoço,volto,eu me movo destas maneiras,para expressar as minhas múltiplas essências,que se inter-relacionam o tempo todo:é a minha essência de professor,de cidadão,de trabalhador,que me move ao meu trabalho;é minha essência de pai que me move para casa de volta;é minha essência de pai que me move para a esposa(em busca de afeição).Eu me presentifico(Dasein) constantemente.Onde o transcendental,Deus,está aqui,senão na minha consciência,que me lava a fazer o sinal da cruz,ao passar de uma igreja?Onde está a ideação invariável?E esta ideação se comunica com algo de fora?O mundo real não resiste,só a minha ideação(pareço Heidegger perguntando indefinidamente...)


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