É
realmente uma pretensão fazer uma autobiografia,uma pessoa comum como eu.Mas ao
longo da vida,com as experiências vividas por mim dentro do movimento comunista
e na relação com todas suas contradições,que me atingiram pessoalmente na vida
familiar,não pude deixar de colocar esta possibilidade.
Isso
foi se consolidando há muito tempo,mas num preciso momento em que vi esta foto
de
Stalin carregando a filha caçula,Svetlana Aliluyeva,filha do segundo casamento
do ditador com Nadia Aliluyeva(que supostamente se suicidou em 1932 diante do
começo da sanha incontida de Stalin),me decidi.
Foi
como se eu me achasse repentinamente,nestes anos de lembranças e memórias,no chamado
“ círculo hermético” de Goethe,um
conceito emitido por ele ,segundo o qual algumas pessoas,no mundo,mesmo que não
se conheçam,participam ou compartilham sentimentos,sensações,idéias,valores,coisas
que as unem de maneira às vezes indelével,como os amantes que se conhecem e constróem
o famoso “ amor à primeira vista” tão negado,mas que existe.
Os
espiritas explicam isto de maneira evidentemente diferente,mas ,de qualquer
forma,o efeito é o mesmo,o de mostrar afinidades eletivas(romance de Goethe em
que ele define estas idéias)entre pessoas que não se conhecem.
Após
uma infância e,porque não?,parte da vida adulta,de contato com todo este
contexto impositivo,agitativo,do stalinismo,primeiro venerado e depois
repudiado,a figura de uma menina,carregada pelo elemento fonte/cristalização de
todo ele,me desencadeou sentimentos de pertencer ao mundo,não da maneira que eu achava,como parte
do movimento que iria dominar o mundo e construir a Utopia,mas como parte da
humanidade em seus descaminhos,esperanças e desilusões.
Assim
como esta menina viveu a alegria da
infância com um “ herói” eu também.Assim como teve que encarar a realidade na
vida madura,eu também e aí ficou claro que escrever sobre mim não significava
narrar fatos pessoais,mas as relações de uma pessoa comum com um fenômeno
histórico complexo,que me atingiu tanto quanto a outros em outros lugares que
se sentiram instados,como eu agora, a
expressar o significado deste contato.
Na
verdade é uma tentativa(como a maioria da dos outros)de percorrer o caminho
psicológico que vai da exultação para a melancolia,da infância solar para um
fim de vida cheio de desolação.
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