Mais
Kant
Quando
lecionava Filosofia do Direito e falava sobre Kant, uma das partes
que eu mais gostava de explicar era distinção do filósofo,na sua
Filosofia do Direito,entre “Quid Ius”,” O que é Justiça” e
“Quid Iuris”,”o que é de direito” ou o direito que se aplica
aos conflitos do real.
Este
meu gosto se explicava e se explica pelo fato de por ele se
determinar o fim do jusnaturalismo e dos modelos,bem como a medida
necessária da sua diluição.
Atribui-se
a Cicero a criação do jusnaturalismo.O jusnaturalismo se define
pela busca de modelos naturais para a cidade,a sociedade e
para,principalmente,o direito.
As
“ leis naturais”seriam permanentes e trans-históricas e por isso
o direito devia reconhecê-las como intocáveis e como paradigma
fundante do comportamento social.
Na
verdade,como explica Popper(A Sociedade Aberta e seus inimigos)o
fundamento do jsunaturalismo e das leis naturais já estava posto por
Aristóteles,o qual localizava no Ser os processos subjacentes de seu
desenvolvimento,de seu movimento ,necessário e permanente.
Mas
o que me chama a atenção é que esta visão jusnaturalista,que
buscava critérios duradouros de comportamento da humanidade,uma
busca muito certa,apresentava e apresenta fraturas,provando que nada
é absoluto.
Reconhecendo
o homem,progressivamente,essa fraturas, ele chega,com Kant,a
superá-lo definitivamente,mas a pura socialização dos critérios
de comportamento ou diluição total dos modelos também não é
absoluta.Kant dilui o direito natural nesta dicotomia acima exposta:a
ideia de uma justiça,como modelo de comportamento é criada pela
experiência dos povos,no tempo e nas suas coordenadas
geográficas,não estando,transcendentalmente,acima das
circunstâncias históricas,como propunha o direito natural.Assim
sendo não existe um conceito de justiça absoluto,mas referenciado a
esta experiência.Kant não propõe um relativismo moral,muito pelo
contrário,ele propõe a comunidade universal moderna(os direitos
humanos universais nascem com a Revolução Francesa e com ele)mas
considerando estas coordenadas temporais e locais.
E
mais,com esta dicotomia,mostra que a filosofia ,o pensamento
,inseridos na luta cotidiana dos povos ,não têm um lugar
especial,transcendente ou transcendental nesta luta,a menos que os
povos assim o decidam,cometendo um erro,porque os modelos
construídos(como sempre)não rompem os seus laços com a experiência
humana.
O
“ Quid Iuris” ,o que é de direito,marca os critérios
comportamentais da sociedade,não só do e no direito(certo e
errado).Ele pode e deve procurar orientação no IUS,mas levando em
conta a sua relação com o tempo e o espaço e dentro de um “
direito”,inevitável(por causa da natureza das coisas),de escolher
quais os critérios que esta orientação porventura oferece.
É
aí que a figura do intelectual abandona definitivamente o modelo
platônico,aristotélico,jusnaturalista,de Rei-Filósofo,que comanda
o mundo,por supostamente conhecê-lo a mais do que os mortais
comuns.O intelectual passa a ser um mortal comum.
O
que ficou em Kant do jusnaturalismo foi o fundamento de sua “
comunidade universal”,o próprio homem e seu direito à vida,por
intermédio do “ Imperativo Categórico”,mas mesmo assim não é
mais o modelo natural,mas algo construído a partir deste
imperativo.Assunto para um próximo artigo.
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