O transcendente não é categoria em Freud
Quando eu falo em transcendência aqui analisando a neurose
não estou dizendo que esta categoria filosófica é de Freud.Freud tinha uma
desconfiança muito grande nas “ especulações filosóficas”e parou de ler os filósofos ,numa certa época,no
dizer dele mesmo.
Isto é uma interpretação minha.No momento em que a criança se
frustra,perdendo o regaço tranqüilo da mãe e do pai,vendo diante de si a inevitável
realidade,onde os seus pais reais estão presentes,ela toma consciência do
transcendente,de uma experiência que
está fora dela ,com a qual terá que lidar até morrer e que não é propriamente
um lugar “ adequado” aos seus desejos,lugar este que já passou.
Mas uma coisa é a realidade,outra o reconhecimento(transcendência
) ,porque esta experiência é um caminho em direção ao mundo hostil,mas uma possibilidade de sua
compreensão e adequação também(dir-se-ia dialeticamente falando).
Quando Freud se refere à religião como “ neurose obsessiva”
da humanidade ,localiza a sua origem nesta frustração primordial,a qual o
individuo resistente quer retornar a qualquer custo ao acolhimento,querendo
encontrar na figura de Deus o pai protetor.
Contudo,ao surgir o caminho da experiência transcendente,verifica-se
que o mundo apresenta desafios irredutíveis ao problema primordial do acolhimento
familiar.
A consciência da morte,da finitude do homem,das desigualdades
e injustiças que nele pululam,não estão presentes,potencialmente na relação
pais e filhos e transcendem esta realidade.
Freud tende sim a ser um monista,explicando a vida social por
este núcleo.
Jesus Cristo,figura mítica,ao ir ao Sinédrio(deixando a virgem
em polvorosa),expressa nesta passagem este transcendente,esta consciência
quanto a si mesmo na relação com o mundo,libertando-se não só do acolhimento
maternal,para amadurecer,mas crescendo na constatação do transcendente(no seu
caso a sua missão),ou seja,que a família não é tudo.Esta é a explicação do que
ele diz à virgem,que o encontra no templo: “ que tenho eu contigo mulher?”.É
uma frase adolescente um pouco grosseira,mas que tem fundamento neste algo mais
e além da família.
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