Aristóteles,diferentemente
de seu mestre Platão,percebeu que na vida social(que ele estudou durante muito
tempo,bem como a natureza)não tem um modelo definitivo de explicação.Como
consequencia a teoria política de Aristóteles,contrariamente à utopia “
absoluta” do mestre,revela que não há nenhum modelo acabado e definitivo,fato
seguido pelos teóricos da política,da filosofia e da sociedade nos séculos seguintes:não há um modelo para as
múltiplas sociedades do planeta.Há que se levar em conta as condições
geográficas,a natureza psicológica dos povos,o seu desenvolvimento histórico e
as mudanças na sua cultura através do tempo.
Sempre
foi assim,mas os gregos é que teorizaram sobre esta complexidade.Os livros são
a base da cultura ocidental e a percepção disso levou os gregos,os fundadores
desta cultura específica e universal ao mesmo tempo,a fundar a primeira biblioteca universal,a de
Alexandria.
Os
gregos constituíram sua cultura,desde a
Jônia,do estudo da natureza,da crítica dos mitos e da sua cultura
mesmo.Platão,Pitágoras e outros filósofos estudaram no Egito,a grande capital
do pensamento até então e estudaram
conhecimentos matemáticos e religiosos desta civilização e da magna Grécia(metempsicose[transmigração
das almas]).Mas, a rigor,os gregos tiram deles mesmos,de seu esforço de
investigação,uma cultura intelectual livresca base do ocidente.
Ao
eclodir o Renascimento,os pensadores “ modernos” foram buscar nesta base a condição
de atualização do saber e criação de novos conceitos.Isto aconteceu porque não
havia alternativa?Não ,a cultura grega era básica na formação do ocidente,que
se caracteriza pelo pensamento perscrutador da realidade.
Não
era preciso uma quantidade de livros para produzir um pensamento novo.Com raras
exceções à formação do renascentista bastavam os gregos(e romanos em algumas áreas).Porque
nos dias de hoje a quantidade passou por cima da qualidade?É porque as relações
ocidentais entre a intelecção e poder se tornaram decisivas,para quem o exerce.
Isto
começou com a indefectível Igreja
Católica e o tomismo ,que fundou a escolástica
.A escolástica se tornou o grande referencial de poder,como
atrativo de adesão ou referencial de repulsão.
O
termo escolástica ,como sabemos,designa a Escola ,de pensamento definitivo.O seu lema era o da
Suma Teológica “ Magister Dixit”,” O Mestre disse”.O mestre ,no caso,é
Aristóteles.O mestre disse e “Roma locuta,causa finita est”,os lemas fundadores
do empoderamento universal, a que todos aspiram e alguns,acertadamente,repelem.
Um
dos conceitos da escolástica é a quantidade de conhecimento que se pode
obter,um conhecimento que se retira,pela revelação,da infinitude da criação de
Deus.Isto quer dizer,no interesse do enpoderamento,que o conhecimento é amplo,talvez infinito,mas não
se pode discutir(quer dizer contraditar) que ele provém de Deus.Se o
conhecimento não confirmar esta realidade ,é herético.São Tomás é a continuação
do sultão que queimou a Biblioteca de Alexandria com o seguinte pretexto:”Se os
livros confirmam o pensamento do profeta Maomé devem ser queimados e se não,o
devem por serem contrários”.E é a base das inquisições modernas(Stalinismo por
exemplo),para as quais o mesmo “ raciocínio” se faz:” Se não é a meu favor está
contra mim”(paranóia[excesso de razão{dogma}]).É o princípio do dogma,que
reproduz ,no mesmo(no permanente),o conhecimento(origem da aufhebung,da
dialética[hegeliana]moderna?)
Contudo,como
é óbvio,o conhecimento não tem comprovada relação com o pensamento,infinito,de Deus.As provas racionais de
São Tomás estão postas em xeque há muito tempo.Deus para o conhecimento e a
filosofia é um problema,não uma certeza(de fé).
O
conhecimento deriva de um referencial prévio e traz algo novo,da natureza ou da
sociedade.Um novo referencial.E nem é, somente, racional .
A
escolástica, no entanto, produziu saberes
muito específicos:teoria das essências,chamada de ussiologia(!).Saberes acadêmicos,filosóficos,
muito complexos.Hermenêutica também.Todos estes saberes são validos intra
muros ,quer dizer,no âmbito da escola .Eles não,podem,contudo,ser usados
para explicar o mundo.Só a filosofia católica integrista defende ,em todo este
tempo, esta proposta.
Esta
visão da escolástica gerou a falsa idéia de que a quantidade de
conhecimento é essencial para a produção do discernimento.Tal proposição se
encaixava( e se encaixa)bem, no empoderamento pretendido.Limitava a
participação de todos no conhecimento,agora dominado pela Igreja,só ela
intercessora do Homem e de Deus.
Mas
,como vimos ,bastou aos renascentistas conhecer os gregos para produzir novas
idéias.O respeito aos gregos era tanto que houve um momento em que se discutiu
se as idéias modernas eram melhores ou piores do que a dos antigos,no que ficou
conhecida como a “ Querela dos antigos e dos modernos”,que propiciou a Charles Perrault
escrever um livro clássico sobre o tema.
Em
que medida a contemporaneidade mudou esta situação?Levando-se em conta o saber
socrático que valoriza o discernimento e o tomismo que o condiciona ao estudo
continuado dos textos,existe uma discussão sobre se basta ler o essencial ou é
preciso ler tudo,como fazia Marx,para escrever “ O Capital”.A erudição é ler tudo?Pode-se
fazê-lo,indiscriminadamente,sem um pressuposto?
O
que mudou na contemporaneidade foi o acesso definitivo,o direito definitivo de
pesquisar e o desencantamento do mundo,abriu a sua (provável)infinitude a uma
gama infinita de conhecimentos ,para uma humanidade(infinita?) ávida de saber.
A
partir disto a possibilidade de associar
conhecimento e quantidade surgiu,de fato,mas não acabou com outros saberes.O
que queremos dizer é que ,dependendo de cada saber,de cada campo,a quantidade é
uma verdade ou não.
Para
fazer uma interpretação de Bergson é preciso ler uma certa porção de livros,saber
filosofia e ter uma maturação.Mas é preciso ler tudo?A filosofia inteira?No
caso de Bergson,a psicologia?
Para
cada objetivo,uma atitude.A profusão de leituras para escrever “ O Capital”
conduziu Marx a uma certeza científica?Há filósofos auto-arrogados no Youtube
que fazem um relação entre Marx e Sócrates,mostrando a necessidade de
discernimento para o pensador alemão e depois,contraditoriamente,afirmam a
exigência absoluta do conhecimento de tudo.
Os
nossos esforços de mostrar a ausência real de uma dialética da quantidade/qualidade,quantidade/discernimento,levam
Hegel e São Tomás( de lambuja)para o lixo da história(em parte) e confirmam o
que estamos dizendo:não há uma regra absoluta de comportamento criativo
intelectual.Tudo depende do objetivo.
É
mais que possível produzir conhecimento de uma literatura básica.Os psicólogos
dizem que a pessoa está apta a se profissionalizar em cinco anos.O primeiro ano
é de adaptação;os dois seguintes de assimilação e os dois últimos( etapas não
rígidas)de maturação e preparação para a prática.A prática que consolida o
conhecimento se dá ,com variações ,em 10 anos.Está é a regra.Mas,para produzir
certos conhecimentos,inclusive na filosofia e dependendo de cada objetivo e de
cada disciplina ,esta regra pode ser mudada.
Os
grandes filósofos se formaram no período que conhecemos como o do “ ensino
básico”.O referido Bergson dava aulas no segundo grau.As condições de formação
de um filósofo,bem entendido,se dão até aos 18 anos.
Músicos,matemáticos,esportistas,se
formam nos primeiros anos.Quando havia o clássico no Brasil a quantidade de
escritores e pensadores era muito maior.
Assim
sendo ,não há,na vida,nenhuma fórmula fechada para nada.Há padrões,mas não um
modelo definitivo.Como digo sempre,a construção de modelos,tem,por trás de
si,um interesse ilegítimo de poder,venha de onde vier.
Hoje
não é necessário estudar todos
os gregos,nem os renascentistas todos
,mas o que considero essencial é o que a antiga editora ediouro
publicava,com os acréscimos de escolha e de necessidade e que hoje são
publicados pela Martin Claret.
Nenhum comentário:
Postar um comentário