Como se sabe a base filosófica do
cristianismo e um de seus elementos formadores é o estoicismo,principalmente o
conceito de ataraxia.
Este conceito foi emitido por um dos
seus fundadores,senão o seu fundador, Zenon de Cicio.
Por ele entende-se que a pessoa deve
ter imperturbabilidade diante do sofrimento.Dele derivam dois problemas
inter-relacionados:o que é esta impertubabilidade e como consegui-la.
Ser imperturbável diante das coisas
ruins que s e apresentam diante de ti,como aconselhava um dos próceres
estóicos,Epicteto(um dos maiores)é algo não muito difícil,mas o mais candente é
enfrentar a dor física,objeto de
análises de Marco Aurélio e Epicuro.
Extrair da dor uma lição.
Da
questão da dor especialmente eu vou tratar em outro artigo,muito embora
tenha a ver ,claro,com este atual que escrevo,mas como demanda mais esforços de
compreensão e argumento,farei assim.
Aqui quero trabalhar com a
intersecção entre o estoicismo pré-cristão e o cristianismo,na sua contribuição
para formar o mito de Cristo.
O estoicismo é uma filosofia
pré-cristã sem dúvida e ela ajuda a compreender a noção que subjaz à
ataraxia,que é “anular-se a si mesmo”.
Esquecer-se de si é uma noção que vem do pensamento
oriental e adquire cristalização na figura do Buda,que quer algo semelhante ao
estoicismo:superar a dor matando o desejo.Estas verdades vão ter reflexo no c
ristianismo e em Cristo através de uma
visão mais radical do que a superação do desejo:o sacrifício,o auto-sacrificio.
Neste momento as tradições oriental e
ocidental se juntam num ponto pela negação do desejo e do prazer,como célula
motora da humanidade.
É isto o que eu desejo ressaltar:sempre
o desejo foi tido como o elemento motivador,mas há nestas duas tradições,quando
se unem ,uma inversão total da “ espoleta”da centelha,que é algo fundamental na
história da humanidade, a partir desta interseccão.
A partir deste aprofundamento:aquilo
que era ataraxia nos estóicos tornou-se sacrifício e auto-sacrificio no
cristianismo e no protocristianismo dos mártires judeus.
Esta “mudança” é muito importante e
explicita aquilo que quero dizer aqui.O aprofundamento significa uma atitude um
poco mais “ coletiva”do que a simples | “imperturbabilidade”.Esta é mais
pessoal,mas intima,indireta,só chegando aos olhos e ouvidos da comunidade
através de textos,exemplos pessoais e assim por diante.
Através do martirológio judeu nota-se
que ele serve de exemplo mora,ético e educativo para a comunidade.O
martirológio judeu “ ensina” e “ educa”
a comunidade para manter o seu sentido.
Além de criar o mito da morte,como
sacrifício e ensinar,pela primeira vez,à humanidade,que se deve saber
morrer,que se deve “usar” a morte para fins sociais,morais e até políticos.
É neste passo histórico que se
cristaliza o (auto-)sacrifício.Há,no entanto,outra questão,que vai se
sincretizar em cristo:o papel educativo e psicológico deste auto-sacrificio.
Enquanto nos estóicos era a
resistência à dor ,agora é “ ressurgir”,fazer do auto-sacrifico um meio de
espicaçar as resistências psicológicas e superá-las pela continuidade do
esforço.
Embora no cristianismo a promessa pelo
sacrifício seja o da “ ressurreição”,em termos laicos,nós podemos entendê-la
como superação das resistências psicológicas,no que é um modo de (auto-)educação.
Às vezes a crueldade do meio nos
ensina,mas não raro,nós mesmos temos que ser cruéis conosco.
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