terça-feira, 18 de julho de 2023

Kant é saúde,Hegel(e Marx) não

 

A comparação necessária que se faz agora entre Kant e Hegel (e Marx), as duas maiores tradições filosóficas do século XIX e que tiveram influência decisiva sobre o século 20 e até aos dias de hoje, faço em termos dos problemas que ambas causam para a subjetividade.

A subjetividade nasce no século XVIII com a figura de Kant ,mas essa pretensão também é atribuída a Hegel.Contudo nesse último caso “há” como diz o outro “controversias”.Não se sabe bem se em Hegel vem primeiro a dialética ou a subjetividade que compreende a dialética. Na verdade sempre foi um problema a discussão sobre o espírito subjetivo e o espírito absoluto.Se considerarmos a dialética ,o espírito absoluto e o subjetivo se integram ,assim como o espírito subjetivo com o espírito objetivo.

Para mim o termo espírito objetivo é muito problemático porque ele só é na medida em que é apreendido pela subjetividade e se integra com ela dialeticamente.Mas nesse artigo quero tratar somente da subjetividade que compreende não só a objetividade mas também essa ideia de absoluto que Hegel tirou de mestre Eckhart.

Na medida em que a subjetividade está integrada pela dialética nessas duas outras mediações supõe-se que é possível um encaixe real sujeito/objeto sujeito/Deus, o qual está também sob a dialética(assiste razão a Garaudy em dizer que em Hegel se completa o ateísmo) .

Este encaixe não é saudável porque cria impressão falsa de que é possível compreender o movimento total do mundo natural e do mundo social e isto é totalmente contestável na medida em que se sabe que não existe uma dialética no mundo todo, que o mundo não se movimenta por contradições dialéticas, como eu já demonstrei em outros artigos citando Popper.

Para mim Kant é saúde exatamente porque coloca essa limitação essencial que não se encontra na tradição Hegel/Marx. No caso deste último penso até que a subjetividade está amarrada a esse princípio dialético como já está na dialética hegeliana. O que para mim significa que a subjetividade fica vai não vai entre a realidade objetiva e a subjetividade com prejuízo para essa última. Podemos dizer talvez mais radicalmente que em Marx a subjetividade acaba, o que induz no futuro toda a desconsideração sobre a vida privada,excetuando-se alguns de seus seguidores que buscaram autonomizá-la ,como Gramsci.

Em Kant é possível compreender alguns padrões aristotélicos pelos quais se apreende o mundo em suas manifestações, mas não todo ele ,admitindo assim que há coisas ,fatos e realidades novas. Além dos limites essenciais, Kant coloca de forma real a existência de um processo de mudança, coisa que a dialética hegeliana nega ,como identificou Proudhon.

No fundo no fundo Hegel é paralisia porque todo o suposto novo que aparece já está limitado pela dialética.O que de certa maneira transforma a mudança em algo do passado. Como no processo psicológico da revolta a dialética coloca o novo, o atual ,a presença ,sob o critério do passado ,o que compromete a realidade da mudança.Porque a dialética é sempre o passado,enquanto pré-dada como mediação explicativa.

O fulcro,no entanto,deste meu artigo é a questão da saude:há uma intersecção entre a filosofia e a psicologia aqui,muito embora Kant não quisesse ver.

A dialética hegeliana é uma forma de idealismo,que remonta à Platão e à sua visão das ideias perfeitas.Todo idealista distorce o real,porque não o apreende na sua complexidade,mas dentro de algo pré-dado,um modelo pré-dado escolhido pela subjetividade.

A objetividade e a figura de Deus passam para eles como modelos supostamente perfeitos,mas a consequencia mais perigosa desta concepção é que a subjetividade se condiciona por este idealismo,qual nome que ele tenha,que ela pensa derivar de si mesma,na sua apreensão do real.

Mas é só pensamento e esta dependência do modelo é a origem possível e arriscada de doenças e debilidades do sujeito.

Lacan,que eu cito pela primeira vez aqui,achava Platão débil e Brunschveig,considerava Hegel um infantil.A razão disto é a subjetividade se colocar como modelo explicativo único do mundo,repetindo uma limitação do humanismo renascentista.

Kant padece do mesmo problema no chamado “imperativo categórico”.Mas neste caso a pura formalidade e equilibrio entre a comunidade e a subjetividade individualizada permite a inclusão de novos conteudos,o que não acontece no caso do idealismo.

Senão vejamos:como salvar a concepção de Platão,adicionando novos conteudos,senão comprometendo a sua episteme ?

E no caso de Hegel(e Marx),como adicionar conteudos se não se admitir algo além da dialética?para ser diferente?Novo?

E no caso de Marx fica provada a sua inferioridade em relação a Kant uma vez que como critico da comunidade universal,que ele não aceita,não é possível adicionar novos elementos sem quebrar esta premissa,que é a sociedade de classes.Se Marx admitisse uma comunidade a sua crítica à sociedade capitalista não teria sentido.

Contudo existe uma comunidade.Parcial ,mas existe ,entre as classes ,sendo um idealismo considerar a dissensão entre elas como único motor da história.

A distorção que leva às doenças começa nesta atroz crença idealista da subjetividade.De apreender o real de forma parcial colocando-se numa dependência desta crença.Daí vêm possivelmente os fetiches,as esquizofrenias e debilidades.

 Con todos os defeitos e limites, o pensamento de Kant começa a por o real no lugar dele e a subjetividade também.Enquanto que Hegel(e Marx)não.


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