Tanto
Marx,como Engels e Lênin sempre afirmaram que o erro da filosofia é acreditar
que a idéia cria o mundo e eu tenho mostrado que isto não é bem assim.Marx (e
os outros)não tinham uma noção muito clara do que era filosofia,em termos
profissionais, e na época deles ,como eu já disse,a filosofia era um amálgama
de ideologia,religião e metafísica barata(Wolf)que,esta última,impressionava
pela sua evidente pobreza.
Por
trás disto tudo,no entanto,havia uma discussão que perpassava a história da
humanidade:Deus,a crença em Deus,significava acreditar que ele criara o mundo e
a filosofia ,em todas as épocas até então refletia esta “ realidade”.Os
comentadores cristãos dos filósofos antigos,principalmente gregos,chamavam o
principio lógico de suas filosofias ,de Deus.Assim o primeiro motor de
Aristóteles tinha que ser interpretado de modo a entrar na concepção cristã de
Deus,como criador do mundo.A idéia do Bem em Platão também passou por este
processo,mas ,neste caso(como no de Aristóteles)embora houvesse um evidente
idealismo não se podia igualar o realismo das idéias com a concepção de um Deus
criador.O homem tinha contato com as idéias ,mas as esquecia no seu caminho
pelo mundo,relembrando-as com a ajuda da filosofia.
Se
nós observarmos bem,mesmo no Deísmo,que resulta da ciência moderna,há alguma
coisa da concepção cristã:o Deus que cria o mundo mas não participa dele é uma
resposta à impossibilidade de encontrá-lo no mecanismo da natureza,após a
criação da física e de outras ciências.Contudo estava lá o compromisso de
admitir que havia um Deus.
A
partir de Vaninni no século XVII e chegando a D´Alembert,que não precisava da
idéia de Deus para explicar o mundo,a questão do Deus criador não deixava de
estar ,no mínimo,rondando a Filosofia.E isso atingiu a época de Marx.
No
caso de Hegel,que é a fonte de Marx,há várias interpretações para o Espírito
absoluto ser identificado com Deus:a concepção de que é Deus ,que se esquece do
mundo é controversa.A identificação de Deus com a natureza vem de São Tomás de
Aquino e de modo geral toda a filosofia que buscava explicar lógicamente o
mundo(até o panteísmo de Spinoza)obedecia a esta identificação.
Porque
Hegel chama o objeto de espírito objetivo tem-se a impressão da presença de um Deus que prescreve a ordem do mundo.A razão universal,no
entanto(que tem reflexos na ideologia alemã[em Proudhon também]{e nos
utópicos}),parece ser a ordem própria das coisas,segundo leis precisas.
Geralmente
toda lógica atribuída ao mundo se faz pela distinção e integração de dois
termos básicos.Por mais complexos que os sistemas metafísicos sejam eles partem
desta premissa básica.
Mas
sempre está lá a idéia de um Deus
criador.Esta situação se torna ainda mais clara com o bispo Berkeley:Se Deus
cria o mundo ele cria a consciência humana que só percebe o mundo(criado por
Deus)a partir desta consciência,criada por Deus.Então Deus é tudo.
Isto
sem falar em um filósofo,anterior a São Tomás,Santo Anselmo,que produziu o “
argumento ontológico”,diluído pelo deísmo de Kant.Pelo argumento ontológico
Deus seria provado porque teria colocado num ser inferior a existência de algo
superior(transcendente).Mas Kant,associando pensamento com a sensibilidade e o
mundo real,substitui Deus pelo transcendente,pela experiência que eleva o sujeito a este mundo por uma experiência de
organização dos seus elementos.A presença
de Deus nesta organização não é
imprescindível para a construção de um sentido transcendente.
Mas
esta estrada toda é para mostrar que Marx e os outros não se deram conta de que
as idéias não são necessariamente ligadas à idéia de um Deus criador,como em
Kant comentado agora.Não era sempre que estes filósofos idealistas
predominavam.Afirmar a subjetividade,como a base da compreensão do mundo não é ser idealista ou defender o pensamento de que
ela cria o mundo.
Locke
buscou com o seu empirismo dizer algo semelhante ao que Marx dirá muito
depois:” nada há no espírito nada que não passe pelos sentidos”.O próprio
marxismo considerou esta afirmação como “ idealista”(porque não dialética) e
Leibnitz contestou(não a Marx,mas a Locke):” exceto o próprio espírito”.Não é
possível dizer o que Locke disse sem recorrer ao espírito ,à subjetividade.Mas
dizer isto não significa dizer que a idéia cria o mundo:ela só o representa.E
Kant dirá que esta representação terá o concurso da sensibilidade.
Idealistas,teológicos
ou não,são Platão,os filósofos cristãos,como São Tomás,Santo Anselmo,Berkeley,sem
dúvida,mas Aristóteles,Descartes e notadamente Kant,é discutível chamá-los
assim.Kant nunca disse que a idéia criava o mundo.
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